Estrutura
Num estudo de casos e controlos é, inicialmente, seleccionado um grupo de indivíduos - doentes - que têm o resultado que pretendemos estudar, geralmente uma doença, e um grupo de indivíduos que não o têm - não-doentes. A selecção dos casos pode ter uma base hospitalar (casos seguidos num determinado hospital), populacional (casos escolhidos de entre todos os caso de uma determinada população), entre outras. A selecção dos controlos deve, na medida do possível, ser feita com o objectivo de obter uma amostra comparável com os casos, isto é, que pertençam à mesma população de base, para a qual será, depois, feita a generalização das conclusões. Para se obter uma amostra de controlos comparável com a de casos os métodos mais usados são: amostragem de casos e controlos de um mesmo modo (ex: casos e não-casos que aparecem num mesmo serviço de urgência); emparelhamento de casos e controlos para certas variáveis constitucionais como idade, sexo e grupo étnico; uso de mais que um grupo de controlos; e uso de casos e controlos seleccionados numa base populacional. Um tipo especial de estudo de casos e controlos é o chamado "nested case-control studies" em que casos e controlos são escolhidos a partir de um coorte previamente formado permitindo, assim, assegurar uma maior comparabilidade dos grupos.
Após a selecção dos participantes, tenta-se, retrospectivamente, determinar a frequência de exposição aos factores que se pretendem estudar, e se pensa estarem relacionados com a doença, em ambos os grupos. Finalmente, comparam-se as frequências de exposição dos doentes com as dos não doentes podendo-se, assim, estimar a relação existente entre a exposição e o desenvolvimento da doença em estudo.
Num estudo de casos e controlos, ao contrário dos estudos de coorte, começa por se fazer a selecção de um grupo de doentes e de um outro de não doentes tornando, assim, impossível e ilógico o cálculo da incidência cumulativa da doença nestes dois grupos, como se faria num estudo de coorte, já que, estes são escolhidos artificialmente pelo investigador e não são o produto do aparecimento natural da doença na população. Consequentemente, não é possível o cálculo, como medida de associação, do risco relativo, através da razão entre o risco (incidência cumulativa) dos expostos e o dos não expostos.
No caso dos estudos de casos e controlos, o que tem significado são as frequências relativas de exposição dos casos e dos controlos. Demonstrou-se que o cálculo do odds ratio, que é um método de comparação das frequências de exposição entre casos e controlos, permite obter uma medida de associação que é conceptual e matematicamente semelhante ao risco relativo.
Figura 1. Desenho de um estudo de casos e controlos.
O odds ratio é definido como a razão entre o odds de exposição dos casos e o odds de exposição dos controlos. Como se pode ver na figura 2 o odds ratio pode ser obtido pela razão dos produtos cruzados da tabela definida para os indivíduos estudados.
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Doença |
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Casos |
Controlos |
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Exposição |
Exposto |
A |
B |
Não Exposto |
C |
D |
Figura 2. Cálculo do odds ratio (OR) num estudo de casos e controlos (estimativa do risco relativo).
Se a frequência de exposição é maior entre os casos, o odds ratio será maior que 1, indicando um risco aumentado de doença com a exposição. Assim, quanto mais forte for a associação entre a exposição e a doença, maior será o odds ratio. Inversamente, se a frequência de exposição é mais baixa entre os casos, o odds ratio será menor que 1, indicando que a exposição é um factor protector em relação à doença. De facto, o significado da informação que é dada por um odds ratio é análoga àquela que é dada pelo risco relativo num estudo de coorte.
O odds ratio é uma estimativa do risco relativo e provou-se, matematicamente, ser aproximadamente igual a este quando a incidência da doença é baixa. Normalmente, as doenças estudadas através de casos e controlos são suficientemente raras como para se poder assumir que o odds ratio e o risco relativo são equivalentes.
Vantagens
Os estudos de casos e controlos permitem estudar doenças raras, já que, não dependem da ocorrência natural da doença, mas sim da identificação de casos da mesma e da sua posterior comparação com um grupo de controlos. Por outro lado, e devido ao seu carácter retrospectivo, este tipo de estudos permitem estudar uma enorme quantidade de factores que se suspeite estejam relacionados com a doença em causa, à custa de um modesto aumento dos custos do estudo.
Num estudo de casos e controlos não é necessário constituir uma coorte de indivíduos que seja seguida durante um determinado período de tempo, não existindo, assim, o risco de haverem perdas de seguimento e tornando, deste modo, o tempo entre o início e o fim do estudo muito menor. Em vez disso, os indivíduos doentes e o grupo de controlos são identificados e examinados quanto à exposição num só "momento", sendo possível a análise dos dados e a obtenção de conclusões quase imediatas. Assim, este é um tipo de estudo muito mais barato, mais fácil em termos logísticos e que permite tirar conclusões mais rapidamente do que os estudos de coorte.
Este tipo de estudos são dos mais frequentemente encontrados na literatura científica por serem uma das maneiras mais rápidas e eficientes de responder a uma questão científica e, por vezes, o único método viável de estudar certas doenças raras.
Desvantagens
Apesar da sua grande utilidade e frequente utilização as limitações deste tipo de estudos são numerosas. Em primeiro lugar têm as limitações inerentes a qualquer estudo observacional. Depois, não permitem estabelecer uma sequência temporal entre a exposição e a doença, isto é, não se pode ter a certeza sobre qual dos dois, exposição ou doença, surge primeiro, nem se é a exposição a causar a doença ou a doença a causar a exposição. Este facto é consequência do carácter retrospectivo destes estudos. Por exemplo, uma relação negativa entre doença coronária e prática de exercício físico, estabelecida através de um estudo de casos e controlos, poder-se-á dever ao facto de os indivíduos que não praticam exercício físico desenvolverem mais doença coronária ou ao facto de os indivíduos que têm doença coronária praticarem, por isso, menos exercício físico.
Uma outra importante limitação é a informação disponível ser limitada uma vez que neste tipo de estudos não existe a possibilidade de obter a prevalência ou a incidência das doenças, nem de calcular directamente o risco relativo ou a diferença de riscos inerente a uma determinada exposição. Por outro lado, através de um estudo de casos e controlos só é possível estudar uma única doença (uma vez que o critério de escolha das amostras é precisamente a presença ou não da doença a estudar), apesar de se poder estudar a sua relação com várias exposições.
As mais importantes limitações deste tipo de estudos, em termos práticos, prendem-se, no entanto, com a existência de viéses de selecção, que surgem tanto na selecção dos casos como na dos controlos, e viéses na medição das variáveis em estudo. Em última análise, o valor científico de um estudo de casos e controlos está na estrita dependência da capacidade do investigador para controlar estes viéses, disto dependendo a validade das conclusões do estudo.
Os viéses de selecção surgem porque para que as conclusões de um estudo sejam válidas é necessário que os casos e os controlos sejam seleccionados de modo a serem grupos comparáveis e isto implica que ambos sejam membros de uma mesma população de base. No respeitante à selecção dos casos a amostra a estudar deve ser representativa de todos os casos da doença, o que pode tornar-se difícil uma vez que os casos disponíveis para estudo não incluem os casos não diagnosticados, erradamente diagnosticados, que morreram, que tiveram remissão ou que estão a ser seguidos noutros locais, no caso de, como frequentemente acontece, ser um estudo de base hospitalar. Assim, para minorar os viéses de selecção dos casos é preferível optar por estudos de base populacional. Muitas vezes, porém, tem que se optar por aquilo que está disponível e, por isto, os estudos de base hospitalar acabam por ser o método escolhido. Quanto à selecção dos controlos esta deve, para evitar os viéses de selecção, produzir uma amostra de controlos o mais possível comparável com a amostra dos casos, fazendo uso dos métodos já enumerados. Esta última tarefa é a mais difícil de levar a cabo e é reveladora da qualidade do estudo. A adequada selecção de controlos é importante porque para poder mostrar que um factor de risco tem um efeito independente tem que se ter em conta a existência de outros factores importantes em que os grupos possam diferir e, eventualmente, ser factores de confusão da relação que se pretende estabelecer (vide supra factores de confusão).
Os viéses na medição das variáveis são muito típicos dos estudos de casos e controlos, nomeadamente, devido ao seu carácter retrospectivo. Três tipos principais de viéses na medição das variáveis surgem neste tipo de estudos: (1) a presença da doença afecta directamente a exposição ao factor em estudo, (2) a presença da doença afecta a memória em relação à exposição (viéses de memória) ou (3) a presença da doença afecta a medição e/ou registo da informação sobre a exposição (surge quando o investigador procede de diferente modo na pesquisa da exposição nos casos e nos controlos, pode ser evitado através de ocultamento do estado de doente ou não-doente).